Dia Nacional do Forró: “Finalmente, comemora-se neste ano a patrimonialização desse importantíssimo gênero musical brasileiro”

Publicado em 13/12/2021. Atualizado em 31/10/2022 às 16h27

Professor Márcio Mattos. Foto: Arquivo Pessoal

O Dia Nacional do Forró é comemorado em 13 de dezembro. A data escolhida faz referência ao nascimento do seu principal representante, o cantor, compositor e sanfoneiro Luiz Gonzaga. Foi decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República, pela Lei Nº 11.176, de 6 de setembro de 2005 (link para uma nova página), a partir de sugestão da então deputada federal Luiza Erundina.

Neste ano, a comemoração é dupla, pois, no último dia 9 de dezembro de 2021, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), durante a 99ª reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, aprovou o relatório que institui esse gênero musical como Patrimônio Imaterial Brasileiro. Na verdade, o que se buscou foi registrar e relatar as “Matrizes Tradicionais do Forró”, a partir de um projeto de pesquisa coletivo que durou mais de dois anos, do qual tive a oportunidade de participar, a convite do professor Dr. Carlos Sandroni (UFPE), como um dos representantes do estado do Ceará, por meio do Centro de Estudos Musicais do Cariri (Cemuc): grupo de pesquisa vinculado ao Curso de Música da UFCA e à Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-graduação e Inovação (PRPI/UFCA).

Devido à grande importância do forró, como um gênero musical que se relaciona fortemente com a cultura brasileira, a Associação Cultural Balaio do Nordeste, do estado da Paraíba, solicitou em 2011 a sua patrimonialização. O processo foi efetivamente iniciado em maio de 2019, por meio de uma cooperação entre o Iphan e a Associação Respeita Januário, lançada durante o Seminário Forró e Patrimônio Cultural, realizado no Centro Cultural Cais do Sertão e no Paço do Frevo, em Recife, que contou com mais de 250 participantes e, inclusive, uma comitiva de alunos do Curso de Música da UFCA (link para uma nova página).

O forró é um gênero musical brasileiro de grande importância e o projeto de patrimonialização empreendido visou “[…] investigar a complexidade das Matrizes Tradicionais do Forró com suas dimensões melódicas, harmônicas, rítmicas e coreográficas, além dos modos de fazer instrumentos musicais, dos contextos sociais e culturais em que a manifestação está inserida, bem como as particularidades dos lugares onde tais referências culturais são mais simbólicas” (link para uma nova página). No Cariri, o forró se manifesta por meio das matrizes tradicionais, gerando diversos eventos que movimentam redes do comércio e do turismo, bem como a cena cultural e artística da região.

O músico Luiz Gonzaga, apesar de natural de Exu, em Pernambuco, considerava-se metade cearense – fato relatado por ele próprio em algumas ocasiões -, devido àsua relação com o Cariri desde a infância, principalmente o município de Crato, acessado por ele e sua família na primeira metade do século 20, por meio da estrada que ficou conhecida como “ladeira do Lameiro” (inclusive mencionada na canção “Eu vou pro Crato”, uma parceria de Gonzaga com José Jataí), que ainda existe e servia de acesso à feira do Crato, local onde seus pais vendiam parte dos produtos de seu trabalho. Além disso, o município era o principal polo cultural e econômico da região, oferecendo diversos serviços, inclusive o transporte ferroviário. O Cariri cearense também foi para o músico um espaço de formação musical, a partir da vivência com as manifestações culturais da região. Sua experiência rendeu composições que fazem referências ao Cariri, com letras que citam lugares, personalidades, manifestações artísticas, festas, religiosidade, fauna e flora.

O forró e as matrizes tradicionais culturais que lhe deram origem estão presentes no cotidiano do povo caririense, e por que não dizer também, do Brasil de maneira geral. Basta ouvir as músicas que fizeram e ainda fazem parte da vida dos brasileiros, lembrar das festas juninas em todo o país, da sua influência na forma de se vestir e falar no Nordeste e outras partes do Brasil, na presença do acordeom nos mais diversos gêneros musicais, na estética e identidade visual associada ao Cariri, na indústria da moda, na poesia sertaneja e em muitas outras áreas.

Ao longo do doutorado em música, apesar de ter cursado na Universidad Complutense de Madrid (UCM), na Espanha, preocupei-me em estudar os agrupamentos musicais tradicionais do Cariri cearense, com a intenção de entender a sua relação com o gênero musical “baião”, lançado em 1946 por Luiz Gonzaga e pelo compositor de Iguatu/CE Humberto Teixeira, por meio da música homônima. A pesquisa (link para uma nova página) resultou na tese “A contribuição da música tradicional do Cariri cearense à música popular brasileira por meio do baião de Luiz Gonzaga” (2016).

Finalmente, comemora-se neste ano a patrimonialização desse importantíssimo gênero musical brasileiro. Especificamente para o Cariri cearense, declara-se o reconhecimento das “matrizes culturais do forró”, e muitas que serviram ao projeto de Luiz Gonzaga são encontradas na região. São fazeres e saberes dos mestres e das mestras da cultura, consolidados ao longo da história, que garantem ao Cariri um espaço de destaque. Somos Cariri!

Márcio Mattos é professor do Instituto Interdisciplinar de Sociedade, Cultura e Artes (IIsca/UFCA)