Design encerra série especial de 15 anos sobre os quatro cursos da UFCA iniciados em 2010
Publicado em 28/07/2025. Atualizado em 28/07/2025 às 16h58

A decisão de Jefferson Grossi de ingressar, em 2016, no curso de design de produto da Universidade Federal do Cariri (UFCA) “caiu como uma luva” diante de seus anseios. Com “muita aptidão para desenhar” e “muita técnica manual”, Jefferson percebeu na formação uma oportunidade de exercer sua criatividade no ensino superior.
“Eu sempre soube que não queria fazer nem direito nem medicina. Vendo as minhas tias e as minhas avós que costuravam, eu sentia que também tinha esse feeling para a criatividade”, avalia Jefferson.
Quando Jefferson ingressou na UFCA, a formação oferecida na área de design era um curso tecnológico, com ênfases em joias ou em calçados e duração de dois anos e meio.

Foto: Davi Moreira – Dcom/UFCA
O curso de design de produto, criado quando a UFCA ainda era o campus Cariri da Universidade Federal do Ceará (UFC), foi aprovado pelo Conselho Universitário (Consuni/UFC) em 24 de julho de 2009 e iniciou suas atividades em 2010 – antes mesmo da oferta do curso de design na sede da UFC, em Fortaleza (cujas atividades começaram um ano depois, em 2011).
Mais tarde, em 2018, a UFCA passou a oferecer também um bacharelado em design, desta vez com ênfases em moda e em design gráfico. As formações coexistiram até a colação de grau dos últimos estudantes do curso de design de produto. Hoje, a UFCA, já desmembrada da UFC, oferta apenas o bacharelado em design.
O presente conteúdo, que narra acontecimentos importantes para a memória do atual curso de design da UFCA, encerra a série especial de 15 anos que revisita a trajetória de quatro cursos da universidade iniciados em 2010: design, engenharia de materiais, jornalismo e música. A série foi produzida pela Diretoria de Comunicação da UFCA (Dcom/UFCA).
Para a designer Rosemary Severo, egressa da turma de 2011 do curso de design de produto da UFCA, a escolha pela formação contou com a “ajuda” do acaso. No Sistema de Seleção Unificada (Sisu), que já era a forma de seleção adotada pela então UFC Cariri, a primeira opção de Rosemary era o curso de administração, também ofertado no atual campus sede da UFCA, em Juazeiro do Norte.
Na época, Rosemary não conseguiu ingressar na sua primeira opção de curso, mas foi convocada para a segunda opção, que era o curso de design de produto: “Eu adorava desenhar, então, esse era um ponto que eu esperava que pudesse contribuir de alguma forma para a minha área de atuação”, relembra.
Segundo a designer, ela sequer sabia o que era design – o que a fez pesquisar sobre o tema pouco antes de sua primeira aula no curso. Rosemary lembra que, nos primeiros dias de universidade, os professores explicaram o que era o curso, que disciplinas cada um lecionaria e também que possibilidades o campo do design poderia oferecer no mercado de trabalho (nacional e regional).

“A partir dessas falas e de algumas vivências, como workshops, cursos e palestras, eu realmente me encantei pelas possibilidades que o curso oferecia”, disse Rosemary. Posteriormente, por meio de convocação de lista de espera do Sisu, ela teve a oportunidade de ingressar no curso de administração, mas preferiu permanecer no curso de design de produto, elegendo a ênfase em joias para o seu percurso profissional.
“Eu já tinha me encantado. Decidi ficar no curso de design de produto porque ele estava mais de acordo com os meus desejos naquele momento”, recorda.
Em setembro de 2013, Rosemary ainda era discente do curso quando teve a oportunidade de participar do programa Ciências sem Fronteiras, na Universidade de Oregon, nos Estados Unidos. Lá, durante um ano e três meses, ela teve contato com conteúdos e técnicas de costura, de marcenaria, de escultura e de desenho, o que impactou positivamente a vida acadêmica e profissional da então estudante.
“Eu sempre me considerei uma pessoa muito tímida, muito calada, muito ‘na minha’ e participar do Ciências sem Fronteiras me trouxe essa experiência de conhecer outras pessoas, outras culturas. Dentro do design, nós exercitamos o ‘olhar do observador’ e, quando a gente trabalha com criatividade, isso é um ponto muito importante”, disse.
Atualmente, Rosemary mora em Brasília-DF e desenvolve projetos gráficos para mídias digitais, especificamente para a Conferências das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP) e para os Brics.
“Bric” é um acrônimo para nomear o conjunto de países composto inicialmente por Brasil, Rússia, Índia e China. O grupo dialoga sobre grandes temas da agenda internacional e fortalece politicamente suas posições comuns. Posteriormente, ingressaram nos Brics África do Sul, Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Indonésia e Irã.
“Eu aceitei esse convite com muita felicidade”
A arquiteta Syomara Duarte, docente da UFC há quase 30 anos e atualmente dedicada a disciplinas de design de moda, foi a primeira coordenadora do curso de design de produto ofertado pelo então campus Cariri da instituição. Entre 2008 e 2009, Syomara integrou a comissão responsável pela elaboração do primeiro Projeto Pedagógico de Curso (PPC) da futura formação. Também faziam parte dessa comissão os professores Ricardo Ness e Vilma Sudério – à época, diretor e vice-diretora do campus.
Segundo Syomara, um dos seus sonhos era que a UFC ofertasse um curso de design: “O professor Ricardo falou com um colega sobre quem poderia fazer parte dessa equipe para o lado técnico e criativo. Esse colega me falou dessa demanda, me apresentou ao Ricardo e eu aceitei esse convite com muita felicidade”, relembrou.

Com o fim da etapa de planejamento pedagógico e curricular do curso de design de produto no Cariri, a formação necessitava de um representante oficial para acompanhar os processos que viriam em seguida. Syomara assumiu essa função e foi coordenadora do curso entre setembro de 2009 e junho de 2010.
“Como eu já era professora da UFC, eu pude ser a primeira coordenadora do curso, exatamente para receber os primeiros professores e acompanhar a implantação de laboratórios, de carga horária… os horários da primeira turma. Uma felicidade muito grande que eu tenho é de ter recebido a primeira turma até mesmo antes de alguns professores terem chegado”, recorda.
Até 2013, ano em que o campus Cariri da UFC se tornou a UFCA, professora Syomara também fez parte, na UFC, da Comissão Permanente para Elaboração, Implantação e Acompanhamento do Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais Brasileiras (Reuni). O Reuni foi fundamental para a implantação dos cursos abordados nesta série especial.
Tradição em joias e em calçados no Cariri
As ênfases em joias e em calçados do curso de design de produto foram escolhidas com base em tradições que já existiam na região do Cariri nessas duas áreas. Conforme professora Syomara, a escolha pelas ênfases em calçados e em joias visou “contemplar áreas produtivas que já estavam no Cariri e que necessitavam de mais desenvolvimento”.
Essas tradições, por sua vez, estão relacionadas à expansão da região do Cariri – intensificadas entre o fim do século 19 e meados do século 20. O ponto central do processo de expansão do Cariri é a tradição romeira que tornou Juazeiro do Norte a principal cidade do sul do Ceará e uma das principais do Nordeste brasileiro.

A peregrinação religiosa para a cidade, que acelerou esse crescimento, está diretamente ligada às figuras do Padre Cícero e da Beata Maria de Araújo. Eles foram os principais agentes do que ficou conhecido como o milagre da hóstia, ocorrido em 1889.
O “milagre” consistiu em uma hóstia, ofertada por Padre Cícero, virar sangue ao ser recebida por Maria de Araújo. Com a propagação do milagre pelas cidades do Nordeste, houve um aumento do número de romeiros que visitavam o Cariri e isso intensificou a busca por mão de obra na região.
Esse processo fez com que a cidade de Juazeiro do Norte também ficasse popularmente conhecida como “cidade-oficina” – termo que reforçou as tradições artesanais que contribuíram para a cultura e para o desenvolvimento da região.
Ana Videla foi uma das primeiras docentes do curso de design de produto da então UFC campus Cariri e assumiu a coordenação do curso em setembro de 2010.

A professora conta que a produção de joias e folheados em Juazeiro do Norte se intensificou em consequência dos inúmeros devotos que tinham o desejo de se casarem na região. Conforme Ana, muitas dessas cerimônias eram celebradas pelo próprio Padre Cícero.
“As pessoas vinham para serem batizadas, casadas… e aí foi formado esse polo joalheiro, muito por conta desses objetos de cunho religioso, como santinhos, medalhas, alianças para casamento etc. A partir disso, ficou uma memória de que a região era muito rica na joalheria”, reforçou Ana Videla.
Especificamente a indústria de calçados, no Cariri, tem origem na segunda metade do século 19, com destaque para os moldes artesanais e para o couro como principal matéria-prima. Com o passar do tempo, a produção calçadista no Cariri contribuiu para que o Ceará figurasse entre os três maiores produtores de calçados do país.
Anos Iniciais
O curso de design de produto da UFC Cariri iniciou suas atividades com apenas sete professoras efetivas, poucas salas de aulas e dois laboratórios: o de joias e o de desenho (este com sala já existente, mas que foi modificada para melhor atender às demandas específicas da formação).
Para Aglaíze Damasceno – que chegou à UFC Cariri em novembro de 2010 para lecionar no curso –, aquele foi um momento de esperança e de renovação, também porque o campus na região ainda estava se estruturando.
“Foi chegar e olhar esse campus começando a ser estruturado, os cursos começando a serem desenhados. Foi um momento muito importante de perceber a região. Foi um momento de início, de primeiros passos. Os desafios do campus naquela época eram principalmente estruturais. Então, também foi um momento de conquista de espaços”, enfatiza a docente, que atualmente é pró-reitora de Cultura da UFCA.

Rosemary Severo lembra que, em sua época como discente do curso, a parte prática era bem limitada, mas, mesmo assim, os estudantes conseguiam realizar esse tipo de atividade.
“O laboratório de joias ainda estava em fase de organizar sua estrutura, ainda estava recebendo os equipamentos. Então, tivemos essa primeira dificuldade. Eu não lembro quantas bancadas tinha, mas a gente conseguia fazer as atividades no laboratório, com certas limitações – sejam elas de materiais ou até mesmo de descobertas da produção de joias”, relembra a designer.
Na época, para pôr em prática o previsto no PPC, faltava implantar outros laboratórios, como o de calçados, o de computação gráfica e o de materiais. Esse último foi concebido para ser compartilhado com o bacharelado em engenharia de materiais.
O primeiro PPC do curso, aprovado em abril de 2009, esteve em vigor até 2018 – ano em que a UFCA recebeu a primeira turma do bacharelado em design e encerrou a oferta de novas vagas para o tecnológico em design de produto.
Preferência por calçados
Em 2012, Rafael Monteiro ingressou no curso de design de produto, ênfase em calçados, após uma sugestão de seu irmão, que cursava biblioteconomia na UFCA: “Acredito que o calçado em si faz parte não só do jeito como a pessoa se veste, mas também de como a pessoa se expressa no mundo”, afirma Rafael, que elegeu essa ênfase mesmo sem um laboratório específico para as atividades práticas, na época.
“Todo esse maquinário que a gente tem hoje aqui [UFCA] não tinha [naquela época]. Não tinha nem a previsão de construir uma laboratório de calçados ou de moda. Tudo isso foi sendo aperfeiçoado com o tempo”, ressaltou.

Conforme professora Aglaíze Damasceno, nos primeiros anos do curso, os estudantes tinham uma preferência maior pela ênfase em calçados, o que, para ela, deveu-se à força do setor calçadista na região.
“[A preferência dos discentes pela ênfase em calçados] estava completamente ligada à influência do setor calçadista naquela época. Então, naquele momento, tinha esse cenário: o polo calçadista já existia, [estava] a pleno vapor e a joalheria existe, mas não chegava muito ao conhecimento da comunidade. Ainda não chegou até hoje”, destacou.
Até a UFCA dispor de instalações apropriadas, as aulas práticas da ênfase de calçados eram realizadas no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) geralmente aos sábados, no turno da manhã, ao longo de um semestre. Os estudantes tinham aulas de costura, de montagem de cabedal (parte superior do calçado que envolve os pés), de colagem do calçado, entre outras.
Conforme Rafael, nem todos os estudantes conseguiam participar das aulas práticas fora do campus, no fim de semana: “Acredito que, para alguns alunos, foi um pouco complicado, porque, por exemplo, tinha estudantes que trabalhavam no sábado, então, não conseguiam fazer as aulas presencialmente lá no Senai. Eles tinham que postergar a disciplina… deixar para outro semestre”, destacou.
Dadas essas dificuldades, segundo Rafael, alguns estudantes escolhiam a ênfase em joias – que já dispunha de um laboratório instalado no campus Juazeiro do Norte, facilitando a logística para o desenvolvimento de projetos.
Para Rafael, as dificuldades não se limitavam ao acesso a laboratórios. O designer também explica que o campus Juazeiro do Norte não tinha a estrutura da qual dispõe atualmente: “Eu me recordo que a universidade não tinha todos esses blocos, era só até o bloco G. O refeitório ainda era no pátio, não tinha asfalto [nas ruas que dão acesso ao campus] para chegar até aqui. Era bem esquisito para gente chegar ao campus, mas foi uma experiência incrível”, relembra.
Em 2019, o Trabalho de Conclusão de Curso de Rafael, “Amana – Umidificador de Ar”, foi um dos três vencedores no primeiro Prêmio de Design do Instituto Tomie Ohtake Leroy Merlin. O reconhecimento levou Rafael a ser contemplado com uma bolsa de estudos no Instituto Europeo di Design (IED), em Barcelona, na Espanha.
O Instituto Tomie Ohtake, fundado em homenagem à Tomie Ohtake (prestigiada artista plástica japonesa naturalizada brasileira), dedica-se às artes visuais e a seus cruzamentos com a educação, a arquitetura e o design.
Hoje, Rafael atua como designer gráfico na equipe de comunicação do Centro Cultural do Cariri Sérvulo Esmeraldo.
Maior tempo de curso e novas ênfases
A partir de 2018, com a criação do bacharelado, a UFCA passou a oferecer uma graduação em design com carga horária total de 2.760 horas e novas ênfases: gráfico e moda.
Conforme professora Ana Videla, dois fatores foram preponderantes para as mudanças: a grande demanda regional por designers de outras especialidades e a necessidade de um maior tempo de formação, que permitisse aprofundamento teórico e prático.
Conforme o atual PPC do bacharelado, o curso tecnológico em design de produto foi pensado para promover a inserção de profissionais na indústria local, mas não deveria se restringir a isso. Ainda de acordo com o documento, era necessário ampliar a formação na área – capacitando os estudantes para a pesquisa e para a docência.
“Desde o início, a gente achava que essa formação de tecnólogo, de dois anos e meio, era muito curta, não dava para o aluno amadurecer, ter um entendimento das possibilidades do design. Então, desde 2010, nas nossas reuniões do NDE [Núcleo Docente Estruturante], a gente já discutia e vislumbrava um curso mais longo”, reforça Ana Videla.

Professora Aglaíze explica que os cursos de graduação da UFCA passam constantemente por avaliações internas, com discussões nos seus respectivos NDEs: “A partir desses encontros, a gente entendeu a necessidade de mudança [nas ênfases]. Assim, começamos a elaborar de que maneira esse curso poderia acontecer”, complementa Aglaíze.
De acordo com Ana Videla, a escolha pela ênfase em design gráfico surgiu a partir das atividades relacionadas ao Programa de Educação Tutorial (PET). Resumidamente, o objetivo de um PET é propiciar aos graduandos a vivência de atividades extracurriculares que complementem a formação acadêmica deles.
Criado em 2012, o Cambada PET Design (PET do curso de design da UFCA), permite que os estudantes elaborem projetos práticos para diferentes clientes, com o auxílio de professores-tutores.
Para Ana Videla, a demanda constante pela criação de identidades visuais, logotipos e ilustrações – recepcionada pelo Cambada – tornou evidente a necessidade de profissionais com conhecimentos específicos na área gráfica. Os demandantes eram tanto os próprios setores da UFCA quanto agentes externos à instituição.
Como forma de absorver todos os investimentos colocados nos laboratórios de joias e de calçados, após a mudança nas ênfases do curso, Ana explica que essas duas ênfases passaram a integrar a área de moda do curso: “A gente entendia que a área de moda também era uma área promissora, então, os laboratórios e as áreas de joias e de calçados acabaram ficando debaixo desse ‘guarda-chuva’ da moda”, lembrou professora.
“Foi a ideia de soma. Nós já tínhamos laboratórios e toda uma estrutura referente ao curso que já acontecia [design de produto]. Então, [pensamos:] ‘vamos somar ao que já está acontecendo?’ Daí que a gente fez a proposição do design gráfico e da moda”, completa Aglaíze Damasceno.
Durante o período de transição da oferta do curso tecnológico em design de produto para a do bacharelado em design, foram ofertadas as disciplinas da antiga e da nova matriz curricular, ao mesmo tempo.
Isso garantiu aos estudantes que ingressaram antes de 2018 a conclusão regular do curso tecnológico, para o qual haviam sido admitidos. Todavia, caso estes desejassem a formação do bacharelado, com foco nas novas ênfases (moda ou gráfico), seria necessário realizar novamente o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), para participação em uma nova edição do Sisu.
“Foi um período de bastante planejamento, focado no envolvimento dos alunos. Teve todo um trabalho para a gente explicar para os estudantes o que estava acontecendo… as causas, os motivos dessas mudanças. Foi um momento de cuidado e cautela, para que o planejamento acontecesse da melhor maneira”, recorda Aglaíze.
Destaque para o design gráfico
Antes mesmo da criação do bacharelado em design (com as ênfases em gráfico e em moda), alguns ingressantes que chegavam ao design de produto, no antigo campus Cariri da UFC, já tinham experiências profissionais em design gráfico.
Isaac Brito – que hoje é docente do atual bacharelado em design da UFCA – trabalhava como arte-finalista em uma gráfica na cidade de Juazeiro do Norte-CE. Ao pesquisar cursos nessa área, ele soube da oferta do tecnológico na região, momento em que decidiu prestar vestibular e ingressar no então curso de design de produto (ênfase em calçados), em 2011.
“A questão é que, na época, o curso de design de produto tinha ênfases em calçados e em joias, mas como abordava design de uma maneira geral, os ensinamentos que tinham para transmitir com certeza poderiam ser aproveitados”, disse Isaac.

Para o atual docente da UFCA, o mercado de design gráfico era forte na região do Cariri desde a sua época de estudante de graduação, o que tornava a atuação profissional na área um caminho quase natural para os formados em design de produto.
Rosemary Severo, que também é da segunda turma do curso, reforça essa ideia ao afirmar que o tecnológico ofertado pela UFCA tinha várias “saídas”, ou seja, oportunidades variadas de atuação no mercado de trabalho – o que facilitou profissionalmente sua vida na área do design gráfico.
“Mesmo cursando [ênfase em] joias, meu TCC foi dentro da área do design gráfico. Até mesmo quando fui bolsista, eu sempre trabalhei na parte do design gráfico. Eu tenho esse título em joias, mas a minha atuação de fato, desde 2015, é no design gráfico”, disse.
Isaac recorda que a estrutura do campus e de seu entorno era um pouco caótica quando ele ingressou no campus Cariri da UFC. Segundo ele, o dia a dia dos estudantes era bem difícil – principalmente em relação ao transporte coletivo.
“[O campus] era muito distante, a questão dos ônibus era muito difícil. Por sorte, na época, eu tinha uma ‘motinha’ que eu consegui comprar, então, era mais tranquilo para mim, mas eu via a dificuldade dos meus colegas em relação ao transporte. Não tinha asfalto, aqui era terra batida, de lama, tinha muito acidente, tinha ônibus atolado no meio do caminho… era bem difícil nesse sentido”, recordou.
Mesmo com a inexistência da ênfase em gráfico durante a sua formação, foi com foco nessa área que Isaac prosseguiu em sua atuação profissional. Em 2016, ele se tornou servidor técnico-administrativo da UFCA, com atuação no curso de jornalismo, especificamente no laboratório de práticas jornalísticas. Lá, durante dois anos, ele acompanhou os projetos de editoração desenvolvidos por estudantes do curso, nas disciplinas de jornalismo impresso.
Em 2019, Isaac retornou à UFCA, agora como docente efetivo do setor de estudos de design gráfico, no curso de design. As disciplinas que ele leciona atualmente no curso estão relacionadas às áreas de Produção de Artefatos Gráficos, Branding (gestão estratégica de marca, no Inglês), Comunicação Publicitária e Editorial.
Desde quando ingressou na UFCA como estudante, Isaac acompanhou diversos momentos de transformação – tanto do curso quanto da universidade. A partir desse contexto, ele destaca que as principais transformações do curso de design estão relacionadas à ampliação – seja do espaço físico ou do corpo docente: “Hoje, ainda temos muitas coisas para fazer, mas estamos indubitavelmente melhores em relação ao que éramos antes”, opinou.
“Um dos maiores desafios foi tentar moldar o curso àquilo que eu queria fazer”
Com a criação do bacharelado, a oferta da ênfase em moda passou a destacar uma área que já despertava o interesse dos estudantes mesmo antes de sua formalização. Um exemplo disso está no percurso formativo do designer Jefferson Grossi, já apresentado no início deste especial.
Grossi afirma que antes da oferta das novas ênfases, a única disciplina da matriz curricular [do curso de design de produto] que estava relacionada ao tema se chamava História da Moda e dos Acessórios – ministrada pela professora Aglaíze. Nesse sentido, conforme Jefferson, foi um desafio trabalhar com moda antes mesmo de a ênfase ser ofertada.
“Quando eu entrei no curso, acho que um dos maiores desafios para mim foi tentar moldar o curso àquilo que eu queria fazer, porque eu me formei em joias e, na época, a gente não tinha moda, então, a [ênfase em] moda começou aqui quando eu estava fazendo o TCC – que foi uma coleção de moda. Então, esse foi o maior desafio”, explicou Jefferson.
Segundo Jefferson, concluir a graduação com um trabalho sobre moda, ao mesmo tempo em que o curso passava por essa transição, fez com que ele se sentisse como uma das primeiras pessoas a abrirem as portas para a ênfase em moda ser efetivada no curso de design da UFCA.
“A professora Aglaíze foi a primeira a basicamente falar pra mim: ‘Jefferson, olha isso aqui! Olha esse tanto de oportunidades que a gente tem no design. Não é isso, nem aquilo. É tudo o que você quiser. Está na sua frente’. É por isso que eu fiz o meu TCC em moda. Não tinha a obrigação de porque eu escolhi a ênfase em joias ter que fazer [o TCC] em joalheria”, enfatiza Grossi.
Desde que concluiu a graduação, em 2019, Grossi criou a sua própria marca de vestuário e, por meio dela, desenvolve projetos autorais de streetwear (estilo de moda urbana surgido entre as décadas de 1980 e 1990) e upcycling (reutilização de resíduos ou materiais descartados de forma criativa). Há três anos, Jefferson atua na área de moda como Microempreendedor Individual (MEI).
Para Jefferson, mesmo com as dificuldades existentes no mercado da moda no Cariri, atuar no setor é uma forma de resistência e uma maneira de afirmar a existência de ações criativas, sem a necessidade de sair da região para encontrá-las.

A ênfase em moda, oferecida pelo bacharelado em design da UFCA, tem contribuído para que outros estudantes, assim como Jefferson Grossi, coloquem em prática o seu talento e a sua criatividade. Exemplo disso são as premiações conquistadas no Dragão Fashion Brasil (DFB), maior evento de moda autoral da América Latina, que ocorre anualmente em Fortaleza-CE.
A cada edição, estudantes das áreas de moda, de design, de estilismo ou de produção têxtil são convidados a criar uma “coleção cápsula” e a apresentar no DFB. Por dois anos consecutivos (2023 e 2024), coleções criadas por graduandos de design da UFCA foram premiadas no “Concurso dos Novos”, que integra o evento.
Em 2023, a equipe composta pelos discentes Pedru Lima, Letícia Zayanne, Thiago Ribeiro, Nayane Araújo, Isadora Silva e Shayna Moura conquistou o 1º lugar na competição. Eles levaram para a passarela do concurso a coleção “Autofagia”, por meio da qual destacaram a degradação da natureza resultante das ações humanas.
Sob orientação das professoras Cristina Rejane e Marina Rios, as peças produzidas pelos estudantes utilizaram materiais como garrafas PET, jeans de reaproveitamento, além da técnica do crochê e do bordado livre.
Já em 2024, a coleção “Descender” conquistou o 3º lugar no evento. “Descender”, que recontou lendas e histórias sobre a criação do Cariri cearense, foi produzida pelos estudantes Camilly Macitas, Luís Eduardo, Giovanna Rodrigues, Adriana Basílio, Bella Sampaio e Pedru Lima, com supervisão dos professores Davi Moreira e Cris Silva.
Equipes da UFCA que já venceram o “Concursos dos Novos”. À esquerda, os campeões da edição 2023. À direita, a equipe da UFCA que ficou em terceiro lugar na edição de 2024. Fotos: Divulgação Design UFCA e Jonas Campos
Para além de participações em eventos, como o Dragão Fashion Brasil, as ações de empreendedorismo fomentadas pelo curso de design da UFCA têm permitido que os trabalhos produzidos pelos estudantes ganhem visibilidade. Com isso, o bacharelado estimula que os discentes coloquem em prática ideias empreendedoras, já durante a graduação.
Desse modo, como explicou Aglaíze, com a mudança para o bacharelado e a proposta de um novo PPC, o curso de design da UFCA incluiu disciplinas que também abordam o empreendedorismo – como “Ética e Legislação Aplicada ao Design”, “Marketing” e “Gestão de Design”.
Conforme o PPC, a matriz curricular do curso prepara os estudantes para o mercado de trabalho, explorando também aspectos de vendas, gestão e ética. Esses pontos, segundo o projeto pedagógico, reforçam o incentivo para que estudantes busquem a independência profissional.
Embora o mercado de moda no Cariri esteja em estágio inicial, Jefferson afirma que a ênfase em moda, agora ofertada pelo curso da UFCA, contribuiu para que essa área se desenvolvesse mais na região.
“Olha que interessante: quando eu me formei, só tinha eu e outro colega com algum empreendimento de moda. Agora, a gente tem estudantes que nem se formaram ainda e já estão com os seus negócios. Eu sinto que a gente já construiu muita coisa e eu sinto que a gente vai construir mais. E eu acho que a gente constrói quando a gente se move”, enfatiza Jefferson Grossi.
Perspectivas para novo PPC
Estar atento às necessidades e transformações sociais que surgem, conforme a professora Ana Videla, tem levado o curso de design da UFCA a discutir novas perspectivas de ensino.
A docente afirma que, atualmente, já há uma demanda crescente por profissionais para atuarem em setores como design de serviço, design digital e design de games no Brasil. Para Ana, é necessário que a formação ofertada pela UFCA acompanhe essas atualizações e esteja em sintonia com o cenário atual.
“A gente está discutindo algumas mudanças no PPC. Não há ainda uma opinião formada, mas eu acho que o curso deveria ser mais generalista. E nós temos alguns exemplos em outras universidades com esse formato, em que são oferecidas algumas habilitações. Até cinco habilitações em alguns casos. Então, estamos nesse momento discutindo [novamente] para onde exatamente nós queremos ir”, conclui.
Os próximos 15 anos do curso
“As minhas expectativas em relação ao futuro do curso é que ele continue realizando o que a gente veio fazer aqui: despertar a criatividade e investir na qualidade do Ensino, da Pesquisa, da Extensão, da Cultura. Espero que o curso continue formando profissionais criativos que se destacam no mercado de trabalho. Que a gente tenha um trabalho consistente, sólido e de qualidade”.
Aglaíze Damasceno, pró-reitora de Cultura e docente da UFCA
“A minha expectativa é que a gente tenha um curso mais generalista, onde o aluno possa experimentar outras áreas, que não só moda e gráfico. Que os estudantes possam ter acesso ao design digital, a jogos, a serviços… e sempre muito atentos aos design situado, ao design daqui do nosso território, sem olhar para o que é feito no exterior.”
Ana Videla, docente da UFCA
“Que o curso melhore, se aperfeiçoe e que a gente possa ampliar o número de estudantes e de professores para tornar o curso mais impactante para a sociedade”.
Isaac Brito, egresso da turma 2011 e docente da UFCA
“Para os próximos 15 anos eu pensaria em investir mais para o curso, para os alunos, investir em mais laboratórios, dar mais oportunidades. Eu vejo, daqui a 15 anos, um curso muito grande, com o mercado de trabalho melhor do que o que a gente tem agora”.
Jefferson Grossi, egresso da turma 2016
“Eu espero ainda mais aperfeiçoamento dos equipamentos, dos professores. Que venham outras formações na área, como um mestrado em design, que eu acredito que a região merece e a UFCA tem o potencial de entregar a primeira formação do interior do estado, na área de design, na pós-graduação”.
Rafael Monteiro, egresso da turma 2012
“Para os próximos 15 anos, eu espero que o curso cresça, que ele vá além e que traga profissionais criativos e muita riqueza para a região do Cariri cearense”.
Rosemary Severo, egressa da turma 2011
Serviço
Curso de design
design.iisca@ufca.edu.br