“Caderno Rosa”, “Revista Bárbaras”, “A Arte de Partejar”: neste 8 de março, conheça ações da UFCA que colocam em prática reflexões feministas

Publicado em 08/03/2021. Atualizado em 31/10/2022 às 15h49

Ilustração do artista visual Ricardo Campos, presente no livro póstumo "Caderno Rosa", de Khettyle Rayane. 2020

Elas representam 47% dos estudantes atualmente matriculados na Universidade Federal do Cariri (UFCA), 42% dos professores da instituição e 44,2% dos servidores em cargos de gestão. Os números são avanços, se lembrarmos que, até o século 18, a educação feminina no Brasil (link para uma nova página) era voltada estritamente aos cuidados domésticos e familiares. Já tendo alcançado diferentes posições de destaque no país, incluindo a própria presidência da república, as mulheres brasileiras do século 21 ainda enfrentam muitos desafios, entre os quais podemos citar a sobrecarga de trabalho, a subestimação constante de suas capacidades intelectuais e, o maior deles, a manutenção da vida em uma sociedade ainda machista e misógina.

Mulheres Trans

Khettyle Rayane – nascida Carlos Miranda em 10 de junho de 1985, em Catolé da Rocha-PB – foi estudante de Filosofia da UFCA à época em que a Universidade ainda era o campus Cariri da Universidade Federal do Ceará (UFC). Khettyle foi, como muitos estudantes da UFCA, a primeira pessoa de sua família a cursar o ensino superior, mas teve sua inspiradora trajetória criminosamente abreviada, em maio de 2017. O Brasil, conforme o Trans Murder Monitoring (“Observatório de Assassinatos Trans”, em inglês), é o país com maior número de assassinatos de pessoas transexuais, liderando o topo do ranking pelos últimos 12 anos.

O falecimento de Khettyle levou a UFCA à descoberta de uma rica produção literária da estudante, intitulada pela própria Khettlyle como “Caderno Rosa”. O conteúdo, organizado pela Pró-Reitoria de Cultura (Procult/UFCA), tornou-se um livro digital, disponível na plataforma e-book da UFCA (link para uma nova página). A obra foi lançada em evento virtual, em novembro do ano passado, durante o segundo Festival UFCA de Cultura/terceiro Colóquio Observatório Cariri. O livro foi impresso com apoio do Sindicato dos Trabalhadores das Universidades Federais no Estado do Ceará (Sintufce), já distribuído em cinco instituições no estado. A distribuição de mais exemplares aguarda contexto epidemiológico favorável ao desenvolvimento de atividades presenciais. A obra póstuma conta, ainda, com ilustrações do artista visual caririense Ricardo Campos.

“Antes do sol nascer
ela já está de pé
erguida para a luta
com coragem, é mulher
Bem cedinho se levanta
pra poder não se atrasar
quanta coisa a fazer
nem mesmo pode descansar”

Trecho do poema “Mulher Guerreira”, de Khettyle Rayane. In Caderno Rosa, 2018.

Feminismos em pauta

A exaltação da “mulher forte” e “guerreira” é comum durante as menções ao 8 de março, o Dia Internacional da Mulher. São títulos aparentemente lisonjeios, mas “ostentá-los”, além de geralmente não ser uma escolha para as mulheres, esconde uma rotina de renúncia e exaustão, seja esta física ou mental.

De acordo com pesquisa da Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2019 – link para uma nova página), feita em 64 países, mulheres dedicam, em média, 3,2 vezes mais tempo do que os homens com trabalhos não remunerados de cuidado. No Brasil, conforme levantamento (link para uma nova página) feito com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2013, se o trabalho doméstico de mulheres fosse remunerado, a renda gerada pela atividade seria de R$ 580 bilhões: 11% do PIB brasileiro naquele ano.

No âmbito da produção acadêmica, o projeto brasileiro Parent in Science (link para uma nova página) perguntou a pesquisadores do país se eles tinham um artigo científico quase pronto ou em vias de publicação durante a pandemia de Covid-19. 40% das mulheres sem filhos afirmaram não terem concluído seus artigos durante a pandemia, contra 20% dos homens sem filhos. Entre mães e pais, 52% delas não concluíram seus artigos, contra 38% deles.

E os desafios de ser mulher nos nossos dias não são os mesmos para todas as mulheres. Conforme estudo do Instituto Pólis, em São Paulo, taxa de óbitos por Covid-19 entre as mulheres brancas foi de 85 a cada 100 mil habitantes. Entre as negras, o número saltou para 140 mortes/100 mil hab. Em entrevista à Agência Brasil (link para uma nova página), o médico epidemiologista do instituto, Jorge Kayano, observou que, em média, a população negra reside “em moradia mais precárias, em bairros com menos infraestrutura tanto de saneamento quanto de acesso a serviços”. No caso das mulheres negras, além dessas questões, elas são a maioria entre os trabalhadores de saúde menos prestigiados socialmente – como auxiliares de enfermagem, agentes de combate a endemias e agentes comunitários de saúde (link para uma nova página). Pessoas que recebem salários menores e têm menor nível de escolaridade.

Entendendo a pauta feminista dentro dessa pluralidade, estudantes de jornalismo da UFCA desenvolvem, desde o ano de 2018, a Revista Bárbaras: um projeto de Extensão da UFCA que difunde debates em torno dos feminismos e das questões de gênero, mas que extrapola o ambiente acadêmico. Além da produção da revista, a iniciativa realiza ações itinerantes em espaços como escolas, associações comunitárias e universidades. A Bárbaras já lançou 4 edições, todas disponíveis on-line (link para uma nova página), e mantém um perfil no Instagram (link para uma nova página).

Saúde Mental

Se todas essas questões já somam uma carga física e mental alta para as mulheres, aliá-las à complexa e multifatorial experiência da maternidade leva muitas mulheres-mães a grandes esgotamentos, principalmente no atual contexto pandêmico. Conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS), de forma geral, mulheres são mais suscetíveis a problemas de saúde mental durante a pandemia de Covid-19. Mães, gestantes e puérperas – pelas alterações hormonais da gravidez e do pós-parto – são ainda mais vulneráveis a quadros como ansiedade e depressão.

Este último grupo ainda enfrenta o medo ou o trauma da chamada “violência obstétrica”, que é quaisquer abusos, desrespeito e/ou maus-tratos durante o parto, praticados em instituições de saúde. Segundo o estudo “Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado” (link para uma nova página), realizado pela Fundação Perseu Abramo em parceria com o Serviço Social do Comércio (SESC), em 2010, uma em cada quatro mulheres no Brasil já foi vítima dessa violência.

Com o objetivo de oferecer assistência em saúde humanizada para mulheres gestantes e puérperas, o projeto de Cultura da UFCA “A Arte de Partejar: a representação do parto por puérperas do Cariri Cearense” (link para uma nova página) estimula mulheres a expressarem através da arte (desenhos, pinturas, colagens, bordados, entre outras expressões) sentimentos sobre a gravidez, o parto, o puerpério e a maternidade. Além de ações em maternidades e de atividades virtuais, o projeto mantém um perfil no Instagram (link para uma nova página) e prepara para breve o lançamento de uma cartilha sobre o processo de parir.

Ser mulher não é fácil e, por isso, o 8 de março é, além de mais um dia de luta para as mulheres, um dia de todos refletirmos sobre conquistas e objetivos dos muitos contextos femininos, de forma que homens e mulheres possam escolher como querem viver, com cada vez menos discrepâncias.

Serviço

Pró-Reitoria de Cultura
procult@ufca.edu.br

Caderno Rosa
Disponível para leitura na plataforma e-book da UFCA

Revista Bárbaras
revistabarbaras@gmail.com
Instagram: @revistabarbaras

Projeto “A Arte de Partejar: a representação do parto por puérperas do Cariri Cearense”
artedepartejar@gmail.com
Instagram: @artedepartejar.ufca